Artigo - O conflito entre Israel e o Hamas pode afetar o preço do petróleo?
- Liga de Comércio Internacional PUC-Rio
- 17 de out. de 2023
- 5 min de leitura

Por: Joaquim Pedro Carvalho Chavez
Desde sua descoberta, o petróleo é uma das principais commodities para a sociedade moderna, sendo uma fonte de energia extremamente eficiente e barata. Yergin (1944) escreveu que a sociedade capitalista industrial moderna é a “sociedade do hidrocarboneto”, a dependência que se possui sobre o petróleo e seus derivados é evidente uma vez que a demanda sobre ela é pouco elástica, ou seja, varia comparativamente menos do que a variação de preços.
Além de seu impacto direto em nossas vidas diárias, o petróleo desempenha um papel central na geopolítica global. A distribuição desigual de reservas de petróleo pelo mundo e a crescente demanda por essa valiosa commodity têm influenciado as relações internacionais e a tomada de decisões estratégicas de maneira significativa. Conflitos e alianças entre nações muitas vezes são moldados pelo acesso e controle das reservas de petróleo, e as questões de segurança energética são fonte de tensão e rivalidades geopolíticas. O petróleo é uma moeda de poder, e entender suas implicações geopolíticas é crucial para analisar o cenário global contemporâneo.
Segundo dados da BP, 8 das 10 maiores reservas de petróleo do mundo pertencem a países da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) e, frequentemente, usam seu preço como uma arma para barganha. Devido aos recentes eventos ocorridos na região de Israel e da Palestina, surge novamente essa incerteza, uma vez que parte majoritária dos países da OPEP são árabes. Diante dessa conjuntura de fatores, evidencia-se a importância de analisar historicamente como o conflito na região afetou e pode vir a afetar a economia mundial.
O caso mais emblemático deste assunto é o choque do petróleo de 1973, quando os países da OPEP anunciaram um embargo na venda de petróleo e seus derivados para os Estados Unidos, em razão da interferência norte-americana na guerra do Yom Kippur. Nos primeiros 3 meses de embargo, outubro a dezembro de 73, o preço do barril do petróleo quadruplicou, saindo de U$2,90 para U$11,65. Entre as principais consequências pode se destacar a inflação, recessões econômicas e um aumento na conscientização sobre a vulnerabilidade das nações em relação às fontes de energia externas.
O embargo durou 8 meses, de outubro de 73 até maio de 74, no entanto, o embargo terminou devido ao efeito rebote que estava tendo aos países exportadores, uma vez que os Estados Unidos não precisaram mudar de comportamento sobre o conflito. Segundo a análise do editor do jornal britânico The Economist, Vijay Vaitheeswaran, a causa pela qual o embargo falhou se dá pela fungibilidade do petróleo, ou seja, o petróleo árabe não apresenta grande vantagem comparativa ao petróleo de quaisquer outros países exportadores. Portanto, os Estados Unidos continuava com acesso à commodity, mas estes países não vendiam em mesma escala que anteriormente.
Este é o principal caso analisado quando se estuda o conceito de interdependência complexa das relações internacionais, pois pela primeira vez foi exposta a fragilidade e dependência norte-americana ao óleo árabe que no início da década representava 83% dessas importações.
Desde então, o conceito de segurança energética se tornou de suma importância na agenda de política externa mundial. Um caso mais recente referente a este assunto foram as consequências trazidas pela guerra russo-ucraniana, onde diversos países do leste europeu tiveram acesso cortado ao gás e óleo russos, que abasteciam a região. As consequências desta medida foi um aumento exponencial do preço da energia na região e risco de passar o inverno sem abastecimento elétrico.
Essa crise de abastecimento europeia causada pelo corte nas relações diplomáticas entre a Rússia e o ocidente vem causando uma série de consequências importantes para entender como será o futuro do mercado internacional. As grandes cadeias de produção em escala global que antes eram o alicerce do sistema capitalista de produção e consumo foi posto em cheque, uma vez que, atualmente, mostrou-se perigoso manter relações diplomáticas com nações que possuem interesses divergentes ou não possuem intenções claras. Está ocorrendo, atualmente, uma crise no neoliberalismo global, onde diversos países estão se voltando para o protecionismo econômico, a exemplo dos Estados Unidos que está abrindo fábricas de chips nacionalmente.
Visto isso, surge o questionamento: o conflito que ocorre na região de Gaza pode afetar, num futuro próximo, a cotação do preço do barril de petróleo? Depende. Segundo uma análise feita pela BP Money, caso o conflito termine no curto prazo a chance de ocorrer um choque é baixa, no entanto, se o conflito perdurar o futuro se torna incerto, e torna-se difícil presumir se ataques oportunistas poderiam ocorrer.
Outra questão importantíssima entra em vigor quando falamos sobre esse assunto, o conflito não foi causado por um país soberano membro da OPEP, foi causado pelo grupo terrorista HAMAS. O HAMAS apesar de ser aliado de alguns países, como o Irã, não tem força de influência suficiente para gerar mudanças no preço do barril. Com uma aproximação recente entre Israel e países como Egito, Arábia Saudita, etc. acredita-se que estas nações procurem trabalhar juntas como forma de evitar um maior escalonamento da guerra.
No entanto, existem visões mais céticas que acreditam que a possibilidade de um aumento do preço é maior. Segundo o economista chefe da Planner Corretora, Ricardo Martins, “O aumento das tensões geopolíticas no Oriente Médio pode ameaçar a produção e as cotações do petróleo se coadjuvantes grandes produtores de petróleo passarem a atuar pela potencialidade da oportunidade apresentada pelo Hamas. Da falha do sistema de segurança e inteligência israelita, às mudanças propostas pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu que trouxeram crise, divisão na sociedade, impacto econômico e preocupação de aliados do Ocidente, não há como não conviver com um ambiente ainda mais incerto e prolongado”. O economista ainda demonstra posteriormente em sua fala preocupação acerca do envolvimento de outros atores como o Hezbollah, e também ressalta a rivalidade histórica entre a Arabia Saudita, que está buscando uma postura mais diplomática, e o Irã, que, como mencionado anteriormente, é aliado do HAMAS.
Dito tudo isso, é sim capaz de afirmar que um choque no preço do barril de petróleo é um futuro factível, no entanto, diferentemente da crise nos anos 70, não seria algo tão dramático. Ataques econômicos no preço do petróleo já se mostraram falhos, e, diferentemente dos casos analisados, estamos diante de um cenário de guerrilha onde os atores envolvidos não são tão influentes quanto os que vimos anteriormente.
Bibliografia:
CANELAS, ANDRÉ LUÍS DE SOUZA Evolução da Importância Econômica da Indústria de Petróleo e Gás Natural no Brasil: Contribuição a Variáveis Macroeconômicas. [Rio de Janeiro] 2007. XI, 120 p. 29,7 cm (COPPE/UFRJ, M.Sc., Planejamento Energético, 2007)
Maiores reservas provadas de petróleo em 2020. Disponivel em: <https://www.ibp.org.br/observatorio-do-setor/snapshots/maiores-reservas-provadas-de-petroleo-em-2020/>
Minadeo, Roberto. Petróleo: a maior indústria do mundo?
Ramos, Anderson. Guerra Israel x Hamas pode afetar petróleo, dólar e Brasil. BPmoney. 8 de Outubro de 2023. Disponivel em: <https://bpmoney.com.br/internacional/guerra-israel-x-hamas-pode-afetar-petroleo-dolar-e-brasil-entenda/>
The economist: what can 1973 teach us? 12 de janeiro 2023 Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=AR2Y8NU3k-k>
Yergin, Daniel. O petróleo: uma história de ganância, dinheiro e poder. São Paulo: Scritta, 1994.
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