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Artigo - As Relações Econômicas na Turquia: crises, desenvolvimento e expansão

Por: Luciana Uchôa Costa Crivellari dos Santos



Fonte: Brasilturis


Resumo

A Turquia, situada entre a Europa e a Ásia, foi fundada em 1923 após a Guerra da Independência e o Tratado de Sèvres. No século XX, aproximou-se do Ocidente, aderindo à OTAN em 1952, e adotou, desde 2003, a política de “Zero Problemas com os Vizinhos” no Oriente Médio. O país enfrentou diversas crises econômicas, incluindo uma grave em 2018, agravada por sanções dos EUA e uma política de crescimento sem limites. Desde 1999, tenta integrar-se à União Europeia, mas as negociações pararam em 2018 por divergências sobre democracia e direitos humanos. No cenário internacional, a Turquia tem estreitado laços com o Brasil, aumentando trocas comerciais e formando parcerias estratégicas. Ambos os países também participaram de negociações diplomáticas, como o Acordo Nuclear com o Irã em 2010. Apesar dos desafios, a Turquia se firma como um crescente ator econômico e político.


  1. Introdução

          Este artigo tem como objetivo analisar os desafios econômicos que a Turquia enfrentou desde sua independência e a formação da República Kemalista. Ao longo das décadas, o país firmou contratos e estabeleceu acordos, incluindo parcerias nucleares, além de se tornar membro de diversas organizações internacionais, como a OTAN. No entanto, a Turquia também enfrentou crises econômicas significativas e questões democráticas que impediram o alcance de metas importantes, como sua adesão à União Europeia. Para compreender a realidade contemporânea do país, é fundamental analisar o desenvolvimento dessas situações e seus impactos ao longo do tempo.

  1. Aspectos Fundamentais da Política-Econômica Turca  

A Turquia possui partes de seu território nos continentes Europa e Ásia, e atualmente é uma república unitária presidencialista. Essa república turca foi fundada em 1923, a partir da Guerra da independência, que havia sido uma resposta ao Movimento Nacionalista Turco e à assinatura do Tratado de Sèvres (1920), criando a paz entre os Aliados e o Império Otomano após o fim da Primeira Guerra Mundial.

De 1923 a 1938, a Turquia passou pela República Kemalista, gerando não somente o nacionalismo turco, como também toda a estrutura estatal turca. Logo, o século XX foi marcado pela aproximação do país com o Ocidente, em especial o continente europeu. Além disso, após a Guerra Fria, o país se aproximou dos Estados Unidos, realizando acordos, como se tornar membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), a partir de 1952. Quanto ao lado oriental do globo, a Turquia tem buscado se reaproximar do Oriente Médio desde 2003, adotando a doutrina de “Zero Problemas com os Vizinhos”, mas também consolidando um governo de partido islâmico em uma república secular democrática. 


  1. ⁠Crise e superação 

Durante toda a história da Turquia, o país sofreu diversas crises econômicas, sendo a última em 2018. Em 2001, houve uma grande crise cambial e bancária que acabou afetando o país, causando o colapso de um programa de estabilização após 14 meses de sua implantação. Neste ano, tanto o consumo agregado quanto o investimento agregado da economia turca entraram em colapso diante das perdas dos portfólios de investidores nacionais e estrangeiros, da redução abrupta do crédito, da incerteza política e do efeito pass-through inflacionário. Já em 2009, houve uma rápida crise que, após estabilizada, o governo turco passou a incentivar cada vez mais pequenos e médios produtores e empresários, dando importância ao setor empresarial e do investimento na economia do país. Além desses incentivos, o governo também realizou campanhas para atrair investidores externos e o capital internacional, principalmente do setor secundário. 

Quanto à parte política-econômica, após o início das revoltas árabes e do conflito na Síria em 2011, o governo turco passou a utilizar uma postura diferente, assumindo grande influência tanto no conflito sírio quanto na participação em mesas com novos governos de partidos islâmicos na região. Devido a isso, a Turquia rapidamente se torna uma possível liderança regional, estando inserida como uma oposição ao regime de Assad, um ato que era apoiado pelos Estados Unidos. Contudo, sua política passou por várias limitações, já que o governo de Assad resistiu e o conflito sírio radicalizou-se, além de que os novos governos islâmicos sofreram derrotas no período de 2013. 

A mais recente crise econômica na Turquia ocorreu em 2018. Um dos motivos foram as sanções que os Estados Unidos impuseram contra dois ministros de Erdogan por conta da prisão de um pastor americano, o que fez o país turco revidar similarmente, sendo esta a crise mais grave entre dois membros da OTAN nos últimos 40 anos. Além disso, houve problemas estruturais, como as eleições presidenciais antecipadas e a política do “crescimento a qualquer preço”, o que gerou grande endividamento ao Estado.


  1. ⁠União Europeia

As crises econômicas experienciadas no país e a sua reputação influenciam diretamente em suas interações com outros países, sendo uma das possíveis causalidades de suas dificuldades em participar de determinados acordos e alianças. Nesse contexto, a sua tentativa de entrada na União Europeia é um dos pontos mais comentados, já que possui esse interesse há décadas, mas nunca foi aceita.

A Turquia obteve o estatuto de país candidato à UE em dezembro de 1999. Em dezembro de 2004, o Conselho Europeu decidiu que a Turquia estava apta para iniciar as negociações de adesão, e rapidamente em outubro de 2005 deram início a essas negociações em uma conferência governamental entre a UE e a Turquia. A partir de então, houve 12 reuniões na qual a última, realizada em 30 de julho de 2016, tratou das disposições financeiras e orçamentais. 

Contudo, o Conselho Europeu observou um afastamento da Turquia com a UE em julho de 2018, chegando a um impasse nas negociações devido às divergências de questões essenciais, como democracia e direitos. Apesar disso, a Turquia continua a ser um candidato forte para a entrada na UE com muitos objetivos em comum, como a migração, saúde pública, a luta contra o terrorismo, clima, entre outros. Tal afirmação se comprova com a declaração do Conselho Europeu em março de 2021, do qual informa que a União Europeia ainda está disposta a colaborar com a Turquia.


  1. Relação com o Brasil

Atualmente, o Brasil busca se posicionar cada vez mais dentro do sistema financeiro internacional e diversificar seus aliados econômicos. O governo atual promove o incentivo de se relacionar com o eixo vertical - relação países Norte-Sul, com a Europa e os Estados Unidos -, e com o eixo horizontal, - relação Sul-Sul, países considerados periféricos e emergentes. O aperfeiçoamento dessas relações é visto com algo positivo pelos estudiosos e profissionais brasileiros, porque em regiões e continentes como o Oriente Médio e África não apenas por ser grande mercados consumidores, mas também ótimos parceiros políticos para a estratégia multilateral brasileira. 

A partir da Cooperação Sul-Sul, a Turquia se destaca como um dos atores importantes dentro desta relação uma vez que possuem características militares, estratégicas e econômicas que condizem com o perfil de potência regional traçado por Buzan e Weaver (2003). Além disso, a Turquia teve uma expansão de 3% em seu PIB entre outubro e dezembro de 2024 e, segundo Turkstat, a economia turca teve avanço de 3,2% em todo o ano.

Contudo, as dificuldades de ambos países por serem emergentes, como desenvolvimento econômico e inserção internacional, também os aproximam. A Turquia possui o desejo de se posicionar como mediador entre países muçulmanos e como uma ponte entre o Ocidente e o Oriente. Isso pode ser visto como uma vantagem para se ter relações com o Brasil, já que o país afirma ter interesse nas agendas Norte e Sul.

Essa aproximação começou no início do século XXI e, durante o governo de Lula em 2009, o presidente brasileiro visitou a Turquia. Um ano depois, em 2010, o Ministro da Turquia, Tayyiq Erdogan veio ao Brasil, ambos encontros foram inéditos naquele período. Durante sua estadia no território brasileiro, um Plano de Ação foi estabelecido entre os dois países, com o objetivo de dialogar sobre política, economia e questões ambientais, além de reiterar seus interesses multilaterais e defesa da não proliferação nuclear. A consequência desta aliança foi um crescimento de aproximadamente 330% nas trocas comerciais entre 2002 e 2008, atingindo o valor de US$ 2.195.456.920 em novembro de 2011. Ademais, a cooperação energética também foi um dos aspectos positivos, com a parceria entre a Petrobras e a Corporação Turca de Petróleo (TPAO) na exploração de petróleo e gás na costa do Mar Negro.

Entretanto, por mais que haja uma grande aproximação entre esses países, ainda existem alguns obstáculos no caminho, como questões nucleares, demográficas e, sobretudo, econômicas. Desse modo, a busca em fortalecer os laços é constante e fundamental para a economia política externa dos países, o fortalecimento do multilateralismo e cooperação Sul-Sul.


  1. Acordo Nuclear

Em maio de 2010, a Declaração Conjunta Brasil, Irã e Turquia, ou Declaração de Teerâ foi firmada. Nesse momento, o Brasil e a Turquia colocaram-se “como mediadores das pressões da sociedade internacional sobre o programa nuclear iraniano” (HERZ; LAGE, n.d., p. 11). O Acordo foi primeiramente anunciado pela Turquia, e o principal objetivo era propor soluções diplomáticas para a crise entre o Irã e o Conselho de Segurança da ONU em torno do programa nuclear iraniano. Dessa forma, reafirmava-se o compromisso do Irã com o Tratado de Não-Proliferação Nuclear e seu direito de pesquisa, produção e uso de energia nuclear para fins pacíficos.

Em tal ocasião, tanto o Brasil quanto a Turquia foram considerados importantes articuladores no cenário internacional, priorizando o diálogo e a paz. Poucos anos depois, em 2015, um acordo entre o Irã e o Conselho de Segurança da ONU foi assinado, do qual utilizaria os principais pontos da Declaração de Teerã.


  1. Considerações Finais

É possível perceber que, embora a Turquia ainda enfrente desafios em suas interações interestatais, devido ao seu histórico e a questões democráticas internas, o país está atualmente engajado no desenvolvimento de projetos de grande relevância e se consolidando como um importante agente social e econômico no cenário global. Dessa forma, embora os processos de negociação possam ser demorados, eles se mostram essenciais para garantir a clareza e a transparência nos acordos e alianças estabelecidas, especialmente aqueles com potencial para impactar significativamente o sistema internacional, como acordos nucleares ou a adesão a organizações internacionais.


  1. Bibliografia

CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA. Turkey enlargement. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/pt/policies/turkey-enlargement/. Acesso em 14/03/2025.

DICHUTA, Rodrigo Miliszewski. A política externa da Turquia para a União Europeia de 2007 a 2017. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Economia) — Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Departamento de Economia e Relações Internacionais, Porto Alegre, 2018. Disponível em: file:///C:/Users/Usuario/Downloads/001097142.pdf. Acesso em 13/03/2025.

GABRIEL, Luciano Ferreira; OREIRO, José Luís. A crise cambial e financeira da Turquia em 2001 e a sua recuperação econômica. Economia e Tecnologia, ano 02, v. 06, jul./set. 2006. Disponível em: file:///C:/Users/Usuario/Downloads/Luciano%20Ferreira%20Gabriel%20-%20Jose%20Oreiro.pdf.  Acesso em 13/03/2025.

GONÇALVES, Natália Barbosa Argiles; CERIOLI, Luíza Gimenez. As relações bilaterais do Brasil com a Turquia e o Irã. In: SEMINÁRIO BRASILEIRO DE ESTUDOS ESTRATÉGICOS INTERNACIONAIS (SEBREEI), 2012, Porto Alegre/RS. Disponível em: https://d1wqtxts1xzle7.cloudfront.net/44643953/RELACOES_BILATERAIS_TURQUIA_E_IRA-libre.pdf?1460430178=&response-content-disposition=inline%3B+filename%3DAs_relacoes_bilaterais_do_Brasil_com_a_T.pdf&Expires=1741557490&Signature=PzPLBrJrABnIdDPFYO3gFl6pLBK85GSAq-BD52D-n7RPY0yitGrEjilMMYM5Hsokmf5EcdAMzVx2Rxs66JvwBCW34habSBwKbmkNewte1tHDpLUDSc-4RrcbzOvyk8Fz9qjwJh~W8UZvWv1y7rIU6RCoQBZSxG2Q9Ll~TQZ1D8CDzWY3njju4K1VJMWbI5~18sbeKH1h~6GKoIBm42x2Xr0ByRyJlpatzvQDIOPaJJmwvLnGiPqRBcxiyurxf4~mFtNu1rlDTs0QtY7RFOwih5FXqG0UDFyCjBmp2xflOh5RMU94ATxCiPYDqCdwqAWvryqitRjC85e2a9Jd2DdWuA__&Key-Pair-Id=APKAJLOHF5GGSLRBV4ZA. Acesso em 13/03/2025.

HERZ, Mônica; LAGE, Vitor. A atual política nuclear brasileira. 2013. Disponível em: . Acesso em: 28 abr. 2014.

MARTINEZ, Cindy Rosa; MAIA, Letícia Azevedo; SANTOS, Vanda Rodrigues. Declaração conjunta de Brasil, Irã e Turquia: análise desse acordo internacional e da participação brasileira. Joint Declaration by Brazil, Iran and Turkey: Analysis of this International Agreement and the Brazilian Participation. Novas Fronteiras, Porto Alegre, v. 1, n. 2, p. 1-17, jul.-dez. 2014. Disponível em file:///C:/Users/Usuario/Downloads/novasfronteiras,+b.pdf. Acesso em 14/03/2025.

ROBERTO, Willian Moraes. A estratégia de liderança regional da Turquia: inflexão da política externa pós-2011 e limites do modelo. IX Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos de Defesa (ENABED), Área Temática 03 – Estudos Estratégicos, Florianópolis, 06-08 jul. 2016. Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP-UNICAMP-PUC-SP). Disponível em: file:///C:/Users/Usuario/Downloads/1466354950_ARQUIVO_2016ROBERTO-AestrategiadeliderancaregionaldaTurquiapos-2011%20(2).pdf. Acesso em 14/03/2025.





 
 
 

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