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Artigo - Como o poder se apresenta nas relações comerciais

Por: Sophia Queiroz

Fonte: Shutterstock


Resumo:

O poder é fundamental nas relações comerciais internacionais, estabelecendo práticas e normas que definem o cenário global. Potências econômicas como Estados Unidos, China e União Europeia usam seu poder de barganha para moldar políticas comerciais que atendam a seus interesses estratégicos. Esse poder se expressa no Hard Power, com sanções e restrições que limitam a atuação de concorrentes, e no Soft Power, que influencia através da disseminação de cultura e valores. Dessa forma, essas nações conseguem ditar padrões e regulamentos no comércio global, criando um sistema alinhado às suas prioridades e fortalecendo sua posição no contexto internacional. Com essa influência, condicionam o comportamento de outros países, sustentando seu papel de liderança e garantindo que o comércio internacional favoreça seus interesses a longo prazo.


Introdução


As relações comerciais entre países são moldadas pela dinâmica de poder que caracteriza o sistema internacional. Assim, no cenário global, países com maior poder econômico, como Estados Unidos, China e membros da União Europeia, destacam-se por sua capacidade de influenciar não só os mercados, mas também as normas e regras que regem o comércio internacional. Esta influência advém de seu poder de barganha, que lhes permite exercer pressão sobre outras nações, estabelecendo políticas que atendam a seus interesses geopolíticos e econômicos. Desse modo, o poder, enquanto uma ferramenta de influência, é essencial para moldar as práticas comerciais de maneira que beneficiem as potências dominantes.


O papel do poder nas relações comerciais


As potências impõem essa forma de soberania ao controlar regulações tarifárias, monitorar taxas tributárias e atuar em conjunto com órgãos reguladores, assegurando que os fluxos comerciais globais estejam alinhados com seus interesses. Dessa forma, atividades como a imposição de barreiras tarifárias e a regulação das taxas são mecanismos amplamente utilizados por países economicamente poderosos para proteger setores estratégicos e, ao mesmo tempo, dificultar a concorrência de outros países, bem como aumentar a influência de outros países no cenário internacional.

Outrossim, a divisão internacional do trabalho (DIT) contribui para essa dinâmica, pois organiza os países em diferentes posições dentro da economia global. Nesse sentido, as potências dominam setores mais lucrativos e tecnológicos, enquanto os países mais vulneráveis se especializam em atividades de menor valor agregado. Isso reforça a hierarquia comercial, mantendo os países economicamente poderosos em posições de vantagem, enquanto limita o crescimento de nações mais fracas, perpetuando a desigualdade e a dependência econômica. Esse cenário limita suas capacidades de desenvolvimento e os mantém em uma posição subordinada, perpetuando um ciclo de dependência e desigualdade no comércio global. Desse modo, por muito tempo, o poder de uma nação era medido por sua capacidade de declarar e manter guerras, utilizando seus recursos econômicos e militares para prevalecer e estabelecer sua vitória. Esse poder, constituído pelo uso da coerção e exercício da força, consolidava a influência de um Estado no Sistema Internacional. No entanto, no período pós-Guerra Fria, com a prevalência dos Estados Unidos como única superpotência, surgiram questionamentos sobre a eficácia dessa abordagem unilateral de poder.


O que torna uma potência essencialmente poderosa comercialmente?


Autores como Joseph Nye, ao estudar o contexto de poder no pós-Guerra Fria, desenvolveu os conceitos de Hard Power e Soft Power para distinguir as diferentes formas de exercer influência. O primeiro termo se refere à habilidade de um Estado em forçar outros a agir conforme sua vontade, seja por meio de demonstração de força militar, imposição de sanções econômicas ou oferta de incentivos financeiros (Politize, 2022). 

Um exemplo de Hard Power econômico aplicado pelos EUA foi a pressão sobre empresas estrangeiras para a suspensão de compra de petróleo do Irã. Em 2018, após a retirada dos EUA do acordo nuclear com o Irã, o governo americano estabeleceu sanções que não apenas afetaram diretamente o Irã, mas também qualquer empresa ou país que continuasse a negociar petróleo iraniano. Os EUA deixaram claro que entidades que mantivessem esses negócios poderiam sofrer sanções econômicas, incluindo a perda de acesso ao mercado americano (G1, 2018). Esse exemplo ilustra como os EUA utilizam sua influência para moldar decisões internacionais através de sanções. Por outro lado, o Soft Power representa a capacidade de influenciar sem coerção direta, mas por meio da atração, influenciando os desejos e decisões de outros Estados. Cultura, valores políticos e política externa constituem as principais fontes de Soft Power (Politize, 2022). Por meio da disseminação de sua cultura e estilo de vida, como o “American Way of Life”, os Estados Unidos continuam a exercer uma grande influência global, promovendo seu modelo capitalista, o que lhes confere hegemonia nas relações comerciais e políticas sem a necessidade de imposição bélica. Esse poder, ainda que intangível e difícil de medir, é sustentado pelo respeito e pela autoridade simbólica construída ao longo de décadas.

Além disso, um outro exemplo claro de Soft Power exercido pelos Estados Unidos nas relações comerciais é a influência do dólar americano como moeda de referência nas transações comerciais globais. Nesse sentido, sabe-se que a moeda americana é largamente utilizada em acordos comerciais, o que confere aos EUA um papel central nas finanças internacionais. Essa predominância permite que estabeleçam condições favoráveis em negociações comerciais e influenciem normas e práticas no comércio global. 

Contudo, apesar de sua tradicional e significativa influência, o Soft Power dos Estados Unidos está sendo progressivamente desafiado, especialmente com a introdução da moeda dos BRICS, que visa a reduzir a dependência da moeda americana e transformar a dinâmica do comércio internacional. Este movimento tende a acirrar as divisões entre as potências ocidentais, como os membros da OTAN, e os países emergentes do Oriente. Nesse contexto, os Estados Unidos enfrentam uma crescente contestação tanto em seu Hard Power quanto no Soft Power, sinalizando uma possível mudança no equilíbrio de poder global.

Portanto, com a análise do Soft e Hard power, é possível entender que o exercício do poder comercial de uma potência vai além das suas capacidades tangíveis, e pode ser expandida pelo meio intangível. Ademais, atualmente, países líderes em inovação, como a China, utilizam o poder para dominar segmentos emergentes, como inteligência artificial e a infraestrutura digital. Tal controle sobre setores tecnológicos confere influência crucial na economia global e impacta profundamente as relações comerciais, uma vez que são capazes de ditar o ritmo e os padrões de inovação tecnológica e suas aplicações comerciais no restante do mundo. Assim, uma potência poderosa nas relações comerciais não é apenas aquela com altos índices econômicos, mas também com habilidade para influenciar padrões, práticas e regulações que afetam o comércio global. A capacidade de barganha, inovação tecnológica e domínio sobre etapas críticas da cadeia de valor são fatores que contribuem para a posição privilegiada desses países.

Ademais, a reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC) tem se tornado um tema central nas relações comerciais globais, especialmente devido às tensões entre os Estados Unidos e a China. Criada em 1995, a OMC tem o objetivo de regular e facilitar o comércio internacional, promovendo transparência e justiça nas interações entre países. No entanto, as mudanças nas dinâmicas econômicas globais, com o crescimento de economias emergentes como a China, geraram discussões sobre a necessidade de atualizar a estrutura da organização, especialmente em relação à resolução de disputas e à regulamentação das práticas comerciais. Nesse âmbito, a China defende a necessidade de que a OMC seja mais inclusiva, levando em consideração as particularidades dos países em desenvolvimento, que possuem um papel fundamental no comércio global, mas enfrentam desafios distintos em relação às economias mais avançadas. Já os Estados Unidos e outros países desenvolvidos defendem uma revisão mais rigorosa da OMC, evitando práticas que possam prejudicar o livre comércio e o desenvolvimento de mercados equitativos (G1, 2019).

O poder, portanto, se manifesta como um elemento essencial que influencia não apenas a esfera comercial, mas também o cenário internacional. Nesse sentido, o poder econômico nas Relações Internacionais ultrapassa os simples indicadores de crescimento e prosperidade, englobando, de maneira estratégica, a habilidade de estabelecer e direcionar normas e padrões que governam o comércio global. Dessa forma, os atores dominantes conseguem moldar o comportamento de outros países e organizações multilaterais, garantindo que o sistema comercial global esteja alinhado com seus interesses e prioridades estratégicas. Destarte, o poder se constitui como uma força que permite às principais potências internacionais perpetuar sua posição dominante no cenário global, moldando um ambiente de comércio internacional que sustente suas vantagens e afirme sua hegemonia, estabelecendo uma ordem econômica global que reflita e reforce seus valores e metas fundamentais.


Conclusão


Nesse sentido, o comércio internacional moderno reflete a complexa interação entre política global e poder, em que cada movimento, tratado e regulação carrega implicações econômicas e estratégicas de longo alcance. Essa constante reconfiguração de influências e interesses é o que torna o comércio uma arena competitiva, na qual o poder continua a desempenhar um papel central.

Neste cenário, o poder se revela como um elemento essencial que não apenas direciona as trajetórias do comércio global, mas também redefine a configuração das economias nacionais e a interação entre os Estados no Sistema Internacional. Essa influência se manifesta na capacidade das potências de estabelecer agendas comerciais, criando um ambiente onde as regras do jogo são constantemente reavaliadas e ajustadas. Assim, o poder não é apenas um fator de controle, mas um motor de transformação que molda as relações comerciais e econômicas, refletindo e reforçando as hierarquias globais e as interdependências entre as nações.



Bibliografia:


BRASIL ESCOLA. Negócios Internacionais. Brasil Escola, 2024. Disponível em: https://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/atualidades/negocios-internacionais.htm. Acesso em: 29 Out. 2024.

BRASIL ESCOLA. Divisão Internacional do Trabalho (DIT). Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/geografia/divisao-internacional-trabalho-dit.htm. Acesso em: 6 nov. 2024.

G1. Guerra comercial: entenda a piora das tensões entre China e EUA e as incertezas para a economia mundial. G1, 16 ago. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/08/16/guerra-comercial-entenda-a-piora-das-tensoes-entre-china-e-eua-e-as-incertezas-para-a-economia-mundial.ghtml. Acesso em: 6 nov. 2024.

G1. Trump anuncia retirada dos EUA de acordo nuclear com o Irã. G1 Mundo, 2024. Disponível em: https://g1.globo.com/mundo/noticia/trump-anuncia-retirada-dos-eua-de-acordo-nuclear-com-o-ira.ghtml. Acesso em: 29 Out. 2024.

POLITIZE!. Soft Power e Hard Power. Politize, 2024. Disponível em: https://www.politize.com.br/soft-power-hard-power/. Acesso em: 29 Out. 2024.

SUNO. OMC: O que é e como funciona a Organização Mundial do Comércio? Suno, 2024. Disponível em: https://www.suno.com.br/artigos/omc-organizacao-mundial-do-comercio/. Acesso em: 29 Out. 2024.



 
 
 

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